Ergonomia Uma Visão Holística

Por Carlos Alberto Romano

A Ergonomia estuda a relação do homem com o seu trabalho e ambiente. Durante muitos anos essa relação foi entendida sob o seu prisma físico, considerando as questões relacionadas à postura, à fadiga e ao desgaste físico dos trabalhadores. Ocorre, porém, quando o homem entra nessa relação com o trabalho, ele não entra apenas com a sua dimensão física; mas sim com toda a sua cognição, com a sua cultura, com o seu repertório e todas as suas emoções e sensações: Ou seja, entra com a sua dimensão holística! Seria, portanto, muito pobre observar essa relação tão rica, apenas pelo seu aspecto físico (e infelizmente até os dias atuais esse tipo de pobreza ainda acontece com muita frequência).

Por assim dizer, a AÇÃO ERGONÔMICA, para trazer contribuição efetiva deve, de forma imperativa, considerar o ser humano em sua dimensão holística. Esse é um desafio para os profissionais da área de ERGONOMIA, que deverão buscar e integrar a visão e a contribuição dos arquitetos, decoradores, engenheiros e técnicos de segurança do trabalho, médicos e enfermeiros do trabalho, terapeutas ocupacionais, psicólogos, advogados, gestores de RH, administradores e especialmente os próprios trabalhadores para contemplar e incorporar essas visões críticas em sua AET – Análise Ergonômica do Trabalho, sob a pena de não trazerem contribuições realmente efetivas para o conforto, bem estar, produtividade e para a saúde do colaborador.

Considerando, ainda, a relação do homem com o trabalho e ambiente, podemos afirmar que essa relação se dá através dos fatores sensoriais do ser humano, os quais permitem a interação do homem com o mundo. Quero dizer com isso que todo ambiente realmente ergonômico deverá levar em consideração as condições adequadas para que esses fatores sensoriais possam ser empregados da forma mais produtiva e confortável possível. A ERGONOMIA se ocupa não somente em respeitar as limitações humanas, mas também em potencializar suas competências.

Exemplo do que acabo de escrever: Um semáforo de trânsito tem, normalmente, 3 lâmpadas coloridas (1 verde, 1 amarela e 1 vermelha). Já existem várias cidades empregando um tipo distinto de semáforo que possui várias lâmpadas de cada uma dessas cores; ou seja, uma sequência de luzes verdes, outra sequência de luzes amarelas e outra sequência de luzes vermelhas, as quais, além de passar a informação de que pode seguir (cor verde), que deve prestar atenção (cor amarela) e que deve parar (cor vermelha) essas sequências de luzes informam também quanto tempo relativo você tem de cada uma dessas cores (ou seja, quando abre o sinal verde, por exemplo, as várias lâmpadas verdes, em sequência, ficam acesas e paulatinamente, quando o tempo vai passando elas vão se apagando, uma a uma, até que a sequência de luzes amarelas seja acionada. Essa sutil diferença ajuda ao Motorista tomar a decisão se deve acelerar (para aproveitar o sinal verde) ou se deve ir reduzindo a velocidade (se o número de lâmpadas verdes não forem relativamente suficientes). Esse é um claro exemplo de como a competência da visão foi potencializada, de forma que ajudou na tomada de uma decisão estratégica (acelerar ou reduzir a velocidade). Vale destacar, ainda, que esse sistema de semáforos com luzes sequenciais contribui de forma preponderante para a redução dos acidentes de trânsito. Trata-se de um excelente exemplo em que a competência humana da visão foi potencializada para refinar a relação com a atividade. Imaginem, por esse exemplo, quantas atividades que envolvem os vários fatores sensoriais poderiam ser potencializadas dentro de um ambiente corporativo. Imaginem agora um ambiente de CCO – Centro de Comando Operacional, onde são utilizados diversos quadros sinóticos, monitores e painéis, o quanto a Ergonomia pode contribuir.

Mais do que simplesmente atender e respeitar aos requisitos fisiológicos envolvidos nos fatores sensoriais humanos, a ERGONOMIA e a ERGONOMIA COGNITIVA, irmanadas aos avanços da ciência, levam em conta a produção de hormônios e de neurotransmissores motivadas pelos desejos e pelas leituras que certas situações de trabalho representam no repertório de cada trabalhador. Dependendo do que representa aquela determinada situação, para o trabalhador, ele poderá produzir distintos tipos de hormônios neurotransmissores, os quais poderão refletir de forma diferente em sua motivação, saúde e produtividade.

Para não ficar apenas no campo teórico, formulo um exemplo: A ADRENALINA é um hormônio NEUROTRANSMISSOR, produzido pela glândula ADRENAL, quando estamos em situação de risco e que nos fornecerá um suprimento extra de energia, para que possamos sair daquela situação de perigo. Em várias situações de estresse a Glândula Adrenal secreta fartas quantidades de Adrenalina que prepararão o corpo para a realização de grandes esforços físicos, o que estimulará os batimentos cardíacos elevando a tensão arterial, relaxando certos músculos e contraindo outros (Nessa situação a pupila dilata-se, o que aumenta a capacidade de visão em situação de perigo, o que pode ajudar numa rápida identificação de eventuais fatores que oferecem riscos).

Fica claro que situações de estresse e de perigo favorecem a produção de ADRENALINA. Se por um lado a Adrenalina oferece um suprimento extra de energia e de disposição, por outro lado a sua produção em excesso gera um substrato que se acumula nos agrupamentos musculares exigidos naquele determinado trabalho: O ácido Lático (para proteger a musculatura que perdeu sais minerais), causando dor e sensação de desconforto (aquela mesma dor que uma pessoa sente quando ficou um longo período sem praticar esporte e quando resolve praticar novamente, no outro dia estará com esses sintomas de dores e de desconforto).

Ambientes estressantes podem, num primeiro momento, trazer aumento de produtividade, no entanto, conforme vimos anteriormente neste texto, a produção contínua de Adrenalina terá elevados custos para a saúde, para o conforto e para a produtividade do trabalhador. Esse “ganho” pontual poderá se transformar em uma grande perda.
Um exemplo antagônico: a SEROTONINA é um NEUROTRANSMISSOR produzido pelo nosso corpo quando há identificação e sentido de grupo (inserção). Esse neurotransmissor é associado ao prazer e à satisfação. Ou seja, ambientes inspiradores e que nos quais nos identificamos, favorecem a produção de Serotonina. Não é sem motivo que empresas como a GOOGLE disponibiliza redes de descanso em seus ambientes de trabalho! Não se trata de um modismo, trata-se de uma empresa cultivando a identidade com seus colaboradores (e vale o lembrete: não adianta sair por aí carimbando a mesma solução; talvez essa mesma rede de descanso nada tenha a ver com a identidade de outros colaboradores de outras empresas).

Dessa maneira fica aqui lançado o desafio: para não mais pensarmos nos ambientes corporativos como postos de trabalhos, mas como cenários… Cenários inspiradores, nos quais os trabalhadores possam se identificar e que possam, sobre tudo, revelar seus dons para aquela sociedade no qual está inserido. Lembrando que o trabalho tem uma dimensão social muito maior do que simplesmente garantir o sustento. O trabalhador projeta-se em seu papel e através dele é reconhecido pelos seus pares (justamente advindo dessa questão a identificação).
Vale ressaltar que as questões intrínsecas à Ergonomia, como os neurotransmissores e hormônios, estabelecem uma relação direta com a propalada NEUROARQUITETURA, a qual encontra fundamentos e apoio na ERGONOMIA.

Ergonomia: Os desafios são grandes e as possibilidades de contribuição também.

 

 

Carlos Alberto Romano

Desenhista Industrial – Ergonomista – Professor e Mediador

Deixe uma resposta